O QUE NÃO ESTÁ NO MAPA - SILENCIAMENTO POLÍTICO DA VIDA EM CAMPO 

Harley (1988) já havia descoberto que os mapas podem ser veículos de poder, reafirmação pela representação - sempre uma externalidade - daquilo que é-como-está no real. O poder de produzir e espalhar mapas provoca, inclusive, um aprendizado alienígena que se naturaliza pela colonização de como dever ser o GEOCORPO DA NAÇÃO, como Winichakul (1994) chama o território em seu livro seminal sobre a importância da EDUCAÇÃO CARTOGRÁFICA para estruturação de um Sri Lanka dominado colonialmente, não só por seus limites, mas pelas novas representações de mundo moderno que se infiltraram na mentalidade dos que ali vivem.

É curioso que em Anapu (PA-Brasil), o único mapa visivelmente disponível em prédios públicos fique afixado na prefeitura - imitação de sede de fazenda, como me comunicou o professor Dieyson Almeida - e mais curioso ainda o próprio mapa: 

"[...] a representação do espaço do campo desaparece em favor da cidade no mapa “Município de Anapu”, no prédio da prefeitura que aparece como sede de fazenda, denotando a trama geossimbólica na afirmação do poder de classe. E os anúncios “as melhores empresas da cidade” reafirmam esse poder, colocando para escanteio o “preserve o meio ambiente” na base do mapa e capturando a área onde deveria aparecer o campo, revelando o fracasso sobre o que se decide ver em um mapa público magicamente preenchido pelo sistema de propaganda (WILLAMS, 2011).

"Uma PROJEÇÃO (projeto gráfico de adequação do real ao representacional) que inscreve o plano emoldurado por quem paga o produto cartográfico urbano-centrado em um apagamento político de espaços de outros sujeitos e da maior parte do município. Essa presença reiterada do urbano no município cuja maioria da população vive no rural não é apenas irônica, revela fraturas de representações do campo com efeitos diversos no imaginário geográfico, fraturas que se tornam inexistência pela escolarização e pela indisponibilidade dos conteúdos e materiais aos professores" (PANTOJA, 2020).

Estas e outras questões ligadas ao sentido fenomenológico de PROJEÇÃO CARTOGRÁFICA, exploro no meu recente artigo publicado pelo Boletim de Geografia de Maringá. Seguem link de acesso: https://www.academia.edu/44435789/Educa%C3%A7%C3%A3o_geocartogr%C3%A1fica_e_tensibilidade_narrativa_criando_proje%C3%A7%C3%B5es_vicinais_Pacaj%C3%A1_Anapu_Par%C3%A1_Brasil_Geocartographic_education_and_narrative_tensibility_creating_sideroads_projetions_Pacaj%C3%A1_Anapu_PA_Brasil_

TEXTOS CITADOS:

HARLEY, B. Mapas, saber e poder,  Confins [Online], 5 | 2009, posto online em 24 avril 2009. URL : http://confins.revues.org/index5724.html 

PANTOJA, W. W. R. Transamazônica: geocartografia da (in)existência entrelugares. 2018. 449 f., il. Tese (Doutorado em Geografia)—Universidade de Brasília, Brasília, 2018.

WILLIAMS, R. Culture and society, 1780-1950. Columbia University Press, 1983.

WINICHAKUL, T. Siam Mapped: A History of the Geo-body of a Nation. University of Hawaii Press, 1997.

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